CTIEJN
Curso
de Teologia da Igreja Evangélica Jesus para as Nações
Nível Básico
Apostila
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Curso de Teologia da Igreja Evangélica Jesus para as
Nações
Nível Básico
Apostila dos Livros Poéticos
Organizadores:
Diretor Pr. José Iracet
Profª Dra. Adriana Röhrig
|
Sumário
Introdução aos livros
poéticos
UNIDADE
1 Livro de Jó
UNIDADE
2 Livro de Salmos
UNIDADE
3 Escritos de Salomão
BIBLIOGRAFIA
Introdução aos livros poéticos
Os livros de Salmos, Jó e Provérbios,
nas Bíblias hebraicas,
formam um grupo
à parte, com a
denominação de Livros
poéticos, porém, acrescentaram-lhes também
o Eclesiastes e
Cântico dos Cânticos; e é frequente
entre os estudiosos gregos, bem como entre os autores modernos, estender a
todos o nome de Livros Poéticos. Isto porque Cântico dos Cânticos e
Eclesiastes são escritos
em versos como
os Provérbios. Eclesiastes possui forma poética, embora menos rigorosa.
Trata-se, portanto, de um elemento comum a todos esses livros.
São
também chamados livros
didáticos ou sapienciais,
por falarem muito
de sabedoria; os salmos são na maior parte do gênero lírico, sem,
todavia, lhes faltar o elemento didático; o gênero do Cântico dos Cânticos é
exclusivamente o lírico. De resto, lírico e didático são os dois gêneros de
poesia apreciada pelos hebreus.
Paralelismo
sinônimo
O que caracteriza
toda a poesia
hebraica é o
chamado paralelismo. Geralmente,
o verso compõe-se
de dois membros
ou frases, que repetem
ideias e palavras
que se
correspondem quanto ao
sentido (paralelismo sinonímico), como, por exemplo:
“Quando Israel saiu do Egito, e a casa de
Jacó do meio dum povo bárbaro, Judá ficou sendo o santuário de Deus, e Israel o
seu domínio" (Sl 114.1-2).
Paralelismo Antiético
Outra
forma de paralelismo
é o paralelismo antitético
que destaca o mesmo
conceito por meio de contrastes, como, por exemplo:
"Um filho sábio é a alegria de seu pai,
porém um filho insensato é a tristeza de sua mãe" (Pv 10.1).
Paralelismo
sintético ou progressivo
A segunda frase não é, às vezes, a repetição, e sim o complemento
do primeiro (paralelismo sintético ou progressivo), como, por exemplo:
"Com a minha voz clamei ao Senhor, e ele
ouviu-me do seu santo monte" (Sl 3.4).
A
observância dos paralelismos
ajuda a compreensão
do verso, visto
que a segunda parte
repete e, muitas
vezes, esclarece obscuridades
ou figuras contidas no primeiro
enunciado. Deve-se notar de maneira
especial que frequentes vezes os dois enunciados paralelos apresentam cada um
uma parte e aspecto da ideia, e unidos formam um só conceito. O citado Pv 10.1 quer significar que o filho
sábio é a glória dos pais, ao passo que o insensato causa-lhes tristeza.
A
poesia do Velho
Testamento é a
mais significativa contribuição
do povo hebreu à
literatura universal, tal
e qual outro
qualquer povo, sua
literatura primitiva era poética.
Não dispomos, no Velho Testamento,
de um conjunto completo dos
escritos poéticos israelitas;
apenas alguns poemas
de significação religiosa foram incluídos nos livros sagrados e nem
todos estão no cânon. Diz-se que "Salomão produziu mais de três mil provérbios
e mil e cinco odes ou cantos". Comentaristas bíblicos
destacam algumas produções literárias das coleções de poesias
conhecidas como "As guerras de Yahweh" (Nm 21.14)
e "O livro
de Jasar" (Js
10.13).
Essa poesia lírica
era essencialmente popular no antigo Israel, o que atesta o número de
sinônimos em hebraico nos "hinos", dos
quais há pelo menos
treze. Somente as ideias
comuns admitem muitas e diferentes palavras para expressá-las. A existência em
hebraico – língua pobre de sinônimos - de treze palavras para indicar hino ou
canto, sugere o largo cultivo da poesia no antigo Israel.
As
linhas da poesia
hebraica são vigorosamente
agrupadas. Em alguns poemas, as estrofes são facilmente
distinguidas. Ocasionalmente, o estribilho ou “coro” vem ao fim de cada estrofe
(Ver Salmo 107.8,15,21,31). Há poucas ocorrências de
rimas na poesia
hebraica. Em Juízes
16.24 temos o
que se chamou "um
hino formado de
uma rima única".
Há uma rima
repetida no primeiro verso
do Salmo 14. O autor
de Isaías 40-66,
ocasionalmente, faz alguma rima.
Em outras palavras, a poesia de Israel omite essa característica, tão essencial
à nossa ideia de poesia. C. C. Torrey sugere que talvez a poesia secular hebraica
usasse mais a
rima do que
a canônica, e os
escritores sagrados a tinham
como "demasiado vulgar
para ser empregada
em composições sérias". Seja essa a razão ou não, a poesia bíblica
emprega, de preferência, os chamados “versos livres”, mais do que qualquer
outra forma. Em resumo, a rima não é
muito usada na poesia bíblica.
A
efetividade da poesia
hebraica é grandemente
devida à sua
liberdade de abstrações. Sempre apela aos
sentimentos fundamentais. No
intuito de expressar seu
desespero, o Salmista
designa as sensações
que o caracterizam, com
as expressões "minha
garganta está seca",
"meus olhos falham",
"eu mergulho em profundas dificuldades e não encontro lugar firme". O
terror da noite
é expresso por
Elifaz (Jó 4.12-17),
com o tremor
dos ossos, silêncio mortal e a
visão de objetos indefinidos.
O poeta deve ter a liberdade de dizer as
coisas da maneira que quiser e, muitas vezes, lida com sentimentos e aspirações
que se perdem no realismo da linguagem. Como Jacó, que lutou com um anjo. Isto
deve ser lido com simpatia espiritual e cooperação. Suas palavras simples não
devem ser consideradas como cortesias etimológicas, nem suas afirmativas
isoladas como fórmulas teológicas.
É
muito fácil perceber-se
o absurdo de
uma interpretação literal
da poesia. Sabem todos que isso
não deve ser feito. Quando se lê no Cântico de Débora: "... dos céus lutaram
as estrelas, de
suas órbitas lutaram
contra Sísera...", o leitor verifica logo que as estrelas não
brandiram suas espadas e entraram em luta. É apenas uma figura poética, de
imaginação, que apresenta o fato de que todo
o universo de
Deus estava aguerrido
contra tal homem
maligno. Outra vez, quando o
livro de Jó se refere ao tempo da criação "...quando as estrelas da manhã
cantaram juntas..." (Jó 38.7), o leitor não deve imaginar uma reunião de
estrelas cantando um hino, mas admitir que o poeta deseja apresentar-nos a
alegria do universo de Deus na linguagem da imaginação. O autor do Salmo 114,
descrevendo a libertação dos israelitas do Egito, assim se expressa: "O
mar o
viu e transbordou;
o Jordão voltou
a sua correnteza.
As montanhas pularam como
carneiros, as colinas, como cordeiros". Nada mais jocoso seria
tomar-se esse quadro
literalmente. Interpretar-se as
passagens poéticas do Velho
Testamento de qualquer
outra forma além
da exaltação como
se apresentam é ignorar o método divino que escolhe poetas acima de
todos os outros, a fim de acenar aos homens do passado e do futuro, ao qual
nenhum estranho tem acesso.
Unidade 1
O livro de Jó
As pessoas têm debatido longa e seriamente
sobre o problema e o significado do
sofrimento humano. O
livro de Jó é
o mais destacado
de todos esses esforços registrados na literatura
mundial.
A narrativa trata da vida de um homem cujo
nome provê o título do livro. O livro abre com uma introdução em prosa que
descreve Jó como um homem rico e reto. Depois de uma série de calamidades, tudo
que ele tem, incluindo seus filhos, lhe
é tirado. A pergunta levantada
no início é
se Jó vai
conservar sua integridade diante
de tamanho sofrimento.
Somos informados que
ele saiu vitorioso: "Em tudo
isto não pecou Jó com os seus lábios" (2.10).
Além de preparar o terreno para o debate
posterior relacionado ao propósito e ao significado do sofrimento, o prólogo
também apresenta as personagens da trama. Deus é o Javé dos hebreus, que é
Senhor do céu e da terra! Satanás aparece no papel de adversário de Jó. O
herói, Jó, é um cidadão rico da terra de Uz. Ele recebe a visita de três dos
seus amigos: Elifaz, o temanita, Bildade, o suíta e Zofar, o naamatita. Estes
três homens vêm trazer conforto para o seu velho amigo.
A
maior parte do
livro é composta
de diálogos entre
os quatro amigos.
Os "confortadores" estão seguros de que o sofrimento de Jó é
causado por algum pecado que seu amigo está escondendo. Eles estão certos de
que humildade e arrependimento vão resolver
a situação. Jó,
por outro lado,
insiste em que, embora possua as fraquezas normais da
raça humana, não cometeu nenhum pecado que pudesse causar tamanho infortúnio
pelo qual está passando. Ele não concorda com a opinião de seus amigos de que
pecado e sofrimento estão invariável
e diretamente ligados
como uma sequência
de causa e
efeito. Parece, a essa
altura, que o
autor pretende mostrar
que Jó deveria
ser o vitorioso na argumentação
contra seus confortadores.
Um jovem espectador chamado Eliú está em
silêncio e não é mencionado no início. Depois de três rodadas de debates com os
outros amigos, ele intervém na discussão. Ele está injuriado com Jó por sua
atitude irreverente em relação à providência de Deus. Ele também está
igualmente indignado com os três amigos pela incapacidade deles de convencer Jó
da sua culpa. Por intermédio de quatro discursos, não respondidos por Jó, Eliú
expressa sua forte oposição no que tange aos sentimentos de Jó e discorda dele
quanto ao significado do sofrimento. Eliú, embora mantenha a posição básica dos
outros conselheiros de Jó, ressalta a providência de Deus em todos os eventos
humanos e o valor disciplinador do sofrimento. Dessa forma, ele exalta a
grandeza de Deus. Diante desse pano de fundo ele afirma que a aflição do homem
contribui para a sua instrução. Se Jó fosse humilde e piedoso, ele perceberia
que Deus o estava conduzindo para uma vida melhor.
Então o Senhor se manifesta no meio da
tempestade. O pedido insistente de Jó
-de que Deus
apareça e dê
significado ao seu
sofrimento -é finalmente atendido. No entanto,
Deus não menciona
o problema individual
de Jó, nem trata
diretamente dos problemas
que ele levantou.
Em vez disso,
Ele deixa claro quem Ele é e o
relacionamento que Jó, ou qualquer homem, deveria ter com Ele.
Ao ver a
glória e o
poder de Deus,
Jó é desarmado
e humilhado. Quando ele vê Deus
em sua verdadeira luz, arrepende-se das suas palavras e atitudes petulantes.
O epílogo descreve de que maneira o arrependido
e humilhado Jó é restaurado, duplicando
a sua prosperidade
anterior. Após a
restauração dos amigos e
da família, Jó
viveu uma vida
longa e feliz
-na verdade, mais
140 anos. Então ele morreu, "velho e farto de dias"
(42.17).
A Historicidade do
Livro
Com frequência, alguns perguntam: Será que Jó
é um homem real? Ou, será que o livro
de Jó é
uma história real?
Estas duas perguntas
não precisam receber a mesma
resposta.
Que
houve um Jó
com a reputação
de retidão é
fato atestado por
uma referência a ele em Ezequiel 14.14. É muito provável que a narrativa
básica do livro tenha sido fundamentada em uma personagem real com esse nome. Não precisamos
com isso, no
entanto, presumir que
o livro de
Jó está descrevendo um
acontecimento histórico do começo ao fim. Somente por meio de revelação
especial o autor poderia ter acesso à informação concernente às duas cenas no
céu descritas nos capítulos 1 e 2. Além disso, é evidente que o prólogo prepara
o terreno para o debate que o autor tem em mente. O diálogo entre os amigos
está em forma poética altamente estilizada, muito diferente de um debate
espontâneo.
Esses e outros fatores têm levado à opinião
geral de que a narrativa básica do livro
é uma história
antiga de um
homem real que
sofreu imensamente. Um autor
anônimo usou esse
material para discutir
o significado do
sofrimento humano e o relacionamento de Deus com ele. Esse autor
realizou um trabalho esplêndido.
Lugar no Cânon
O livro de Jó faz parte da terceira divisão
do cânon hebraico, o Kethubim, os hagiógrafos,
ou Escritos. A
ordem nessa divisão
tem variado nas
diferentes tradições. Atualmente Jó é colocado entre Provérbios e
Cantares de Salomão (Cânticos de Salomão)
no cânon hebraico. A Tradução
Brasileira coloca Jó entre Ester e os Salmos, onde Jó é o
primeiro dos três grandes livros poéticos. Essa é
a ordem usada
por Jerônimo na
sua tradução Vulgata
e subseqüentemente ela foi
confirmada no Concílio
de Trento (1545-1563)
em sua declaração oficial do cânon das Escrituras.
Autoria
O
nome Jó (heb.
'iyyôb) tem sido
interpretado de várias
maneiras. Uma sugestão é
"Onde (está) meu
Pai?". Outra leitura
deriva o nome
da raiz ‘yb, "ser inimigo". É possível
entendê-Io como uma forma ativa (oponente de Javé) ou como uma forma passiva
(alguém a quem Javé trata como inimigo). Pode haver um
jogo de palavras
quando Jó lamenta
ser "inimigo" ('ôyêb)
de Deus (13.24
Por
causa do suposto ambiente patriarcal da história e da crença de que Moisés
seria seu autor, a Bíblia siríaca o insere entre o Pentateuco e Josué. A
incerteza quanto à data e ao gênero literário respondem por às diferenças de
localização.
Quanto
à sua autoria estudiosos do Antigo Testamento concordam entre si em que uma
busca pelo autor desse livro está fadada ao fracasso. Em nenhuma parte do
livro existe qualquer
tipo de indicação
quanto à identidade
do homem que
criou essa obra de
arte literária. O
livro não só
se mantém calado
em relação à sua
origem, mas também
não encontramos nenhuma
sugestão bíblica independente em relação à sua autoria.
Ezequiel (14.14,20) menciona um homem chamado Jó, conhecido por sua retidão; e
Tiago (5.11) o reconhece como
modelo de paciência.
Essas duas referências
mencionam um indivíduo chamado Jó. Elas não tratam da identidade do
autor do livro.
Embora
o nome do
autor nunca venha
a ser conhecido
por nós, algumas qualidades desse homem podem ser
determinadas por meio do livro que ele escreveu. Quem quer que ele tenha sido,
foi uma das maiores figuras literárias do
mundo. Qualquer lista
de grandes obras-primas
na área da
literatura certamente incluirão livro de Jó. Na verdade, muitos a colocariam
no topo da lista. Alguns literatos descrevem o livro de Jó como o maior poema
dos tempos antigos e modernos, dizendo que não existe nada dentro ou fora da
Bíblia com o mesmo valor literário.
Entende-se que, ou o
autor de Jó sofreu grandemente
em sua própria
vida ou ele
teve uma capacidade incomum de
sentir compaixão e empatia por aqueles que sofriam. Junto com essa grande
sensibilidade ele foi profundamente religioso. Ele tinha uma percepção
fora do comum
quanto à natureza
humana e estava
bem inteirado com o
mundo no qual
vivia o mundo
da natureza, das
ideias e da literatura.
Enfim, podemos aceitar
que o autor
desconhecido do livro
tenha usado um
homem histórico "de Uz",
chamado Jó, conhecido
por todos pelo
seu sofrimento e integridade, para ser o herói desse
diálogo. Outras perguntas relativas à autoria devem permanecer sem solução.
Data da Composição
A época da composição desse livro permanece
um problema tão complicado quanto o da
autoria. Diversas datas
foram sugeridas e
elas variam desde
o século XVIII até o século lII a.C.
De
acordo com a
descrição do livro,
o homem Jó
mostra um tipo
de vida e cultura que mais se aproxima do período
patriarcal. Por exemplo, “o livro afirma que
Jó viveu mais
140 anos depois
da restauração da sua saúde
e riqueza, além dos anos que ele
tinha vivido antes do seu infortúnio”
(POPE, 1965, p. 135). Não há
expectativa de vida
como essa na
narrativa bíblica depois
do período patriarcal. A
riqueza de Jó
consistia basicamente em
rebanhos e manadas, como ocorria com
os patriarcas. O próprio Jó oferece sacrifícios pela sua família,
como era o
costume dos patriarcas.
No entanto, ele
parece desconhecer a oferta pelo pecado e outras práticas mosaicas.
A data do livro de Jó permanece uma questão
aberta, mas a opinião majoritária é que o diálogo ocorreu no século VII a.C. Levanta-se a hipótese que tenha sido escrito
entre Gn 11 e 12.
O livro de Jó lida
com uma pergunta universal:
“Se Deus é justo e amoroso, por que permite
que um homem realmente justo, tal
como Jó (Jó
1.1,8) sofra tanto?”
Sobre
esse assunto o
livro revela as seguintes verdades:
(a)
Satanás, como adversário de Deus, teve permissão para provar a autenticidade da
fé de um homem justo, por meio da aflição, mas a graça de Deus triunfou sobre o
sofrimento, porque Jó permaneceu firme e constante na fé, mesmo quando parecia
não haver qualquer proveito em permanecer fiel a Deus.
(b) Deus lida com situações demais elevadas
para a plena compreensão da mente humana (Jó 37.5). Nesses casos, não vemos as
coisas com a amplitude que Deus vê e precisamos da sua graciosa autorrevelação
(Jó 38—41).
(c)
A verdadeira base da fé acha-se, não nas bênçãos de Deus, nem em circunstâncias
pessoais, nem em teses formuladas pelo intelecto, mas na revelação do próprio
Deus.
(d)
Deus, às vezes, permite
que Satanás prove
os justos mediante contratempos, a fim de
purificar a sua
fé e vida,
assim como o ouro é refinado pelo fogo (Jó 23.10; confronte 1Pe
1.6,7). Tal provação resulta numa maior integridade espiritual e humildade do
seu povo (Jó 42.1-10).
(e)
Embora os métodos de Deus agir, às vezes, pareçam contraditórios e cruéis
(conforme o próprio Jó pensava), ver-se-á, no fim, que Ele é plenamente
compassivo e misericordioso (Jó 42.7-17; confronte Tg 5.11).
A Provação de
Satanás
Uma das primeiras referências do Antigo
Testamento a esse adversário é seu aparecimento no prólogo. Satanás tem acesso
à presença de Javé, mas é governado
pela soberania Dele.
Nada dá a
entender que Satanás seja
mais que criatura
de Deus; a
doutrina bíblica da
criação bane toda forma
real de dualismo.
Mas tudo dá
a entender que
as intenções de Satanás são nocivas. Ele representa o
conflito e a inimizade. Seus propósitos são contrários aos alvos de Deus e
hostis ao bem-estar de Jó.
A ausência de Satanás no epílogo não deve ser
"lamentada como uma falha na harmonia
entre o prólogo
e o epílogo". Trata-se de um fator deliberado na mensagem do
livro. Deus, não Satanás, é soberano. O teste foi vencido. A história aponta
para o futuro de Jó, não seu passado. Satanás não passa de um intruso no
relacionamento entre Deus e Jó, conforme descrito no início e no fim do livro.
A função de Satanás em Jó anuncia sua função
no restante da Bíblia. Ele é uma criatura de Deus, mas um inimigo da vontade de
Deus (cf. Mt 4.1-11; Lc 4.1-13).
Ele procura perturbar
o povo de
Deus física (2Co
12.7) e espiritualmente (11.14). Ele foi derrotado
pela obediência de Cristo e desaparecerá da história no final (Ap 20.2,7,
10).
O centro da estratégia de Satanás não era
induzir Jó a cometer pecados tais como imoralidade, desonestidade ou violência,
mas tentá-lo para que cometesse o pecado - ser desleal a Deus. A lealdade, a
confiança e a fidelidade são a essência da piedade bíblica, as raízes de onde
brotam todos os frutos da justiça. Satanás, seguindo seu padrão de sempre,
buscou a raiz do problema: o relacionamento de Jó com Deus. Jó passou pelo
teste de lealdade e conquistou notas máximas, apesar de seus protestos e
contestações.
Esboço do Livro
I.
Prólogo: A Crise (1.1—2.13)
A.
Jó, Sua Retidão e Seu Temor a Deus (1.1-5)
B.
As Calamidades Sobrevindas a Jó (1.6—2.10)
C.
Os Três Amigos de Jó (2.11-13) II. Diálogos entre Jó e Seus Amigos: A Busca de
Resposta Humanista (3.1— 31.40)
A.
Primeiro Ciclo de Diálogos:
A
Justiça de Deus (3.1—14.22)
1. Jó Lamenta o Dia do Seu Nascimento (3.1-26)
2. Resposta de Elifaz (4.1—5.27)
3. Réplica de Jó (6.1—7.21)
4. Resposta de Bildade (8.1-22)
5. Réplica de Jó (9.1—10.22)
6. Resposta de Zofar (11.1-20)
7. Réplica de Jó (12.1—14.22)
B.
Segundo Ciclo de Diálogos:
O Fim do Ímpio (15.1—21.34)
1. Resposta de Elifaz (15.1-35)
2. Réplica de Jó (16.1—17.16)
3. Resposta de Bildade (18.1-21) 4. Réplica de
Jó (19.1-29)
5. Resposta de Zofar (20.1-29)
6. Réplica de Jó (21.1-34)
C.
Terceiro Ciclo de Diálogos:
Jó e o Problema do Pecado (22.1—31.40)
1. Resposta de Elifaz (22.1-30)
2. Réplica de Jó (23.1—24.25)
3. Resposta de Bildade (25.1-6)
4. Réplica de Jó (26.1-14)
5. Jó Resume a Sua Posição (27.1—31.40)
III.
Discursos de Eliú: O Começo do Entendimento (32.1—37.24)
A.
Apresentação de Eliú (32.1-6a)
B.
Primeiro Discurso: Deus Instrui o Ser Humano Através da Aflição
(32.6b—33.33)
C.
Segundo Discurso: A Justiça de Deus e a Presunção de Jó (34.1-37)
D. Terceiro Discurso: A Retidão é Recompensada
(35.1-16)
E.
Quarto Discurso: A
Excelsa Grandeza de
Deus e a
Ignorância de Jó (36.1—37.24)
IV.
O Senhor Responde a Jó Diretamente (38.1—42.6)
A. Deus Demonstra a Ignorância de Jó
(38.1—40.2)
B. A
Humildade de Jó (40.3-5)
C.
Deus Repreende a Jó por Sua Crítica (40.6—41.34)
D.
Jó Confessa Sua Ignorância dos Caminhos de Deus (42.1-6)
V. Epílogo: Desfecho da Prova (42.7-17)
A. Jó Ora pelos Seus Três Amigos (42.7-9)
B. A Dupla Bênção de Jó (42.10-17)
Unidade 2
O
livro dos Salmos
O título em português vem da tradução grega,
Septuaginta, concluída em cerca de 150 a.C. Psalmoi, o termo grego,
significa "cânticos" ou "cânticos sagrados" e é
derivado da raiz
que significa "impulso, toque", em
cordas de um instrumento de
cordas. O título
hebraico é Tehillim, e
significa
"louvores" ou
"cânticos de louvor".
Os
Salmos têm uma
importância especial na
Bíblia. Lutero descreveu
esse livro como "uma Bíblia
em miniatura" (THOMPSON, 1962, p. 1059). Calvino o descreveu como
"uma anatomia de todas as partes da alma", visto que, como explicou,
"não existe emoção que
não é representada aqui
como em um
espelho". Johannes Arnd escreveu: "O que o coração é para o
homem, os Salmos são para a Bíblia". Oesterley descreve os Salmos como
"a maior sinfonia de louvor a Deus que já foi escrita na terra".
O Saltério hebraico detém uma posição
singular na literatura religiosa da humanidade.
Ele tem sido
o hinário de
duas grandes religiões
e tem expressado a vida
espiritual mais profunda dessas religiões ao longo dos séculos. Esse
Saltério tem ministrado
a homens e
mulheres de raças, línguas e
culturas muito diferentes.
Ele tem trazido
conforto e inspiração aos aflitos
e abatidos de
coração em todas
as épocas. Suas
palavras podem se adaptar
às necessidades das
pessoas que não
têm conhecimento algum acerca de sua forma original e pouca compreensão
a respeito das condições sob as quais foi formado. Nenhuma outra parte do
Antigo Testamento tem
exercido uma influência
tão ampla, profunda
e permanente na alma humana.
O lugar que Salmos recebe no Novo Testamento
claramente testifica sobre o valor
desse importante livro.
Dos aproximadamente 263
textos do Antigo Testamento citados no Novo Testamento,
um pouco mais de um terço, ou seja, um total de 93 é tirado do livro de Salmos.
Alguns deles, mais particularmente os
Salmos 2 e
110, são citados
diversas vezes. W.
E. Barnes escreve: "Somente a
existência de uma
verdadeira continuidade espiritual
entre os Salmos e
o Evangelho pode
explicar o profundo
sentimento de afeição
com que os cristãos de todas as épocas têm tratado o Saltério".
Esboço do Livro
I
Livro 1 Salmos 1—41
II
Livro 2 Salmos 42—72
III Livro 3 Salmos 73—89
IV Livro 4 Salmos 90-106
V Livro 4 Salmos 107-150
Duas observações quanto ao esboço acima são
dignas de nota: Desde os tempos antigos, os 150 salmos são organizados em cinco
livros, tendo cada um, na sua conclusão, uma enunciação de louvor e invocação
dirigida a Deus, a saber: Livro 1 — 41.13; Livro 2 — 72.19; Livro 3 — 89.52;
Livro 4 — 106.48; Livro 5 — 150.1-6. O salmo 150 não é apenas o último dos
salmos; é também uma enunciação de louvor e invocação a Deus; ele é também uma
doxologia para todo o saltério.
Estrutura
do Livro
Desde
os primórdios da
sua história o
livro de Salmos
no hebraico tem
sido subdividido em cinco "livros" ou divisões que são
especificados na maioria das traduções
modernas. O Livro
I inclui os
Salmos 1-41. O
Livro lI, inclui
os Salmos 42-72, o Livro IlI, os Salmos 73-89, o Livro IV, os Salmos
90-106 e o Livro V, os Salmos 107-150.
O Midrash judaico, ou comentário dos Salmos,
compara esses cinco livros com os cinco livros de Moisés, o Pentateuco. A
divisão está provavelmente relacionada com o ciclo de três anos da leitura da
Lei que predominava na Palestina primitiva. O livro de Gênesis era lido nos
primeiros quarenta e um sábados. A leitura de Êxodo começava no quadragésimo
segundo sábado, Levítico no septuagésimo
terceiro sábado, Números
no nonagésimo e Deuteronômio no
centésimo sétimo sábado
correspondendo com o primeiro salmo de cada livro.
Também é provável que o livro de Salmos atual
seja, na verdade, uma coleção de coleções. Isto se observa tanto na natureza
como no agrupamento de títulos e na afirmação em 72.20: "Findam aqui as
orações de Davi, filho de Jessé". Um exame nos títulos dos salmos no Livro
I revela que todos eles são creditados a Davi com exceção de 1; 2; 10 e 33.
Curiosidade:
Os Salmos 146 - 150 são conhecidos como o
Grande HalIel. Cada um desses cinco salmos inicia e termina com a palavra
hebraica Hallelu-Yah, que significa: "Louvai ao Senhor".
Abordagem
introdutória
O
livro de Salmos
é o primeiro
livro na terceira
divisão da Bíblia
hebraica. Conhecida como Kethubhim
ou Escritos, essa terceira divisão era popularmente conhecida
pelo nome do
primeiro livro, isto
é, "Os Salmos". Deste modo, Jesus incluiu todo
o Antigo Testamento no que tange às profecias a seu respeito "na Lei de
Moisés, e nos Profetas, e nos Salmos" (Lc 24.44).
Um
dos valores mais
importantes dos Salmos
para o estudo
do Antigo Testamento é
a percepção que se recebe
acerca da verdadeira
natureza da religião do
Antigo Testamento. Os Salmos mostram claramente que nos tempos
do Antigo Testamento a piedade era uma fé viva, espiritual, alegre e intensamente
pessoal. Os Salmos refletem um
nível de espiritualidade que muitos da dispensação cristã mais favorecida
não conseguem alcançar. Os Salmos representam o aspecto interior e espiritual
da religião de Israel. Eles são a expressão múltipla da intensa devoção das
almas piedosas a Deus, do
sentimento de confiança,
esperança e amor
que alcançava um clímax em diversos Salmos como o 23; 42;
43; 63 e 84. Eles são a voz da oração de tonalidade múltipla no sentido mais
amplo, à medida que a alma se dirige a
Deus por meio da confissão,
petição, intercessão, meditação, ações
de graças, louvor,
tanto em público
como em particular.
Eles oferecem a prova mais completa, se é que isso era necessário, de
como é completamente falsa a noção de que a religião de Israel era um sistema formal de ritos e cerimoniais
externos.
A Data
dos Salmos
A metade dos salmos foi escrita por Davi. Os
títulos o identificam como autor de 73 salmos. Atos 4:25 e Hebreus 4:7 atribuem
mais dois ao segundo rei de Israel. Salomão, o filho de Davi, acrescentou mais
dois (72 e 127), e Moisés escreveu um (90). Vários homens que conduziam o
louvor em Jerusalém (Asafe, Etã e os descendentes de Corá) escreveram 25 dos
salmos. Os autores de quase um terço dos salmos não se identificam.
Assim, as datas dos salmos abrangem, pelo menos,
nove séculos. Moisés escreveu no 15º século a.C., e alguns dos salmos foram
escritos depois da volta do cativeiro (veja, por exemplo, Salmo 147:2), que
aconteceu no 6º século a.C. A grande maioria vem da época do reino unido,
quando a arca da aliança foi levada a Jerusalém, e o templo foi construído
naquela cidade.
A diversidade dos salmos traz uma riqueza especial
à sua qualidade como exemplos de adoração. Eles tratam de toda espécie de
experiência humana. Falam de vitória e alegria, e de medo e perseguição.
Refletem as emoções de homens espirituais gozando comunhão com o Criador, e de
pecadores sentindo falta dele. Pedem bênçãos sobre os justos e punição dos
ímpios. Podemos aprender muito das diversas experiências de Davi, Asafe e
outros salmistas de Israel.
Compilação
Sabe-se
que existiram hinos,
usados no culto
em Babilônia e
no Egito, por muitos séculos antes de Abraão e José.
Embora fosse um caso notável se a salmodia hebraica não se apresentasse sinais
de ter crescido de tal solo, uma semelhança
de estrutura literária,
como por exemplo,
o uso extenso
do paralelismo, não é índice de igual riqueza e vigor espirituais. Neste
aspecto, os Salmos de Israel não têm rival. A base do Saltério parece ser
constituída por uma coleção dos hinos davídicos.
O grupo principal pareceria ser Sl 51-72, mas
há outros grupos davídicos, nomeadamente, 2-41 (omitindo o 33), 108-110 e
137-145. Talvez nem todos estes sejam atribuíveis a Davi, mas a sua composição
marca o estilo e constitui o núcleo. É presumível que tenha havido mais do que
um centro onde os hinos hebraicos foram colecionados, do mesmo modo que houve
mais do que uma "escola de profetas". Durante os séculos em que estes
grupos se fundiram, algumas repetições foram aceitas. Estas continham habitualmente
variantes, em que aparecia a palavra Eloim para o nome de Deus, de hinos que se
referiam a Deus como Jeová, mas havia ainda outras diferenças ligeiras (2Sm 22
e Sl 18). Os principais salmos duplicados são o Sl 14 e o Sl 53; o 40.13-17 e o
Sl 70.
Pouco depois da constituição dos primeiros
grupos davídicos vieram associar- se com eles duas coleções de Salmos
levíticos, a de Coré (42-49) e a de Asafe (50, 73-83). Alguns destes podem
ter-se originado nos principais regentes das escolas de cantores (1Cr 6.31,39);
outros receberam os seus títulos como uma indicação do
estilo ou do
lugar de origem.
Os Salmos de
Asafe são mais didáticos, dão maior proeminência às
tribos de José e fazem um maior uso da imagem
do pastor e
do discurso direto
por parte de
Deus. A estes
grupos combinados foram acrescentados uns poucos Salmos anônimos (33;
84-89) e também o Sl 1, introdutório.
Os Salmos restantes, 90-150, revestem-se de
um caráter muito mais litúrgico e incluem
vários grupos de
hinos que têm
uma forte unidade
tradicional, por exemplo, o
Hallel Egípcio (113-118), os quinze Cânticos dos Degraus (120134), e o
grupo final (145-150).
Outros, como 95-100
(os cânticos sabáticos
de alegria), estão obviamente
relacionados uns com
os outros como
estão também os Salmos
92-94 e 103-104.
Moisés foi tradicionalmente associado com os Salmos 90 e 91, e há um fundo histórico comum
para Salmos como 105-107; 135-136. Não é possível explicar como estes grupos de
Salmos chegaram a ser selecionados, coordenados e finalmente combinados numa
grande coleção. A poucos deles pode atribuir-se uma data definida; uns são de
Davi, outros são distintamente pós-exílicos. É absolutamente possível que
muitos tenham sido revistos através de séculos de uso litúrgico. (Nota: alguns
"Salmos" aparecem dispersos pelo Velho Testamento, como, por exemplo,
Êx 15.1-21; Dt 32; Jn 2; Hc 3 e mesmo os oráculos de Balaão em Nm 23-24).
Deve notar-se também que Salmos em que
aparece o pronome "EU" podem não ter sido originalmente pessoais. A
sociedade hebraica encontrava-se de tal modo unida que o indivíduo podia
identificar-se com o grupo a que pertencia e o povo, como um todo, podia ser
considerado como uma personalidade coletiva. Eis por que muitos Salmos, que
parecem ser pessoais, podem entender-se como expressões de uma comunidade
unificada por alguma experiência geral e falando por meio de uma pessoa
representativa.
Interpretação
A interpretação dos Salmos depende do nosso
conhecimento da condição da crença
religiosa e da
revelação ao tempo
da sua composição
e da nossa própria
experiência de Deus
em Cristo. Pensa-se
muitas vezes que
certas passagens se referem
à vida depois
da morte (por
exemplo, 16.10; 17.15; 49.16; 73.24,36; 118.17), e tanto
quanto conhecermos o poder da ressurreição de Cristo, podemos ler tais
declarações à luz daquela verdade. O salmista não conhecia tal certeza, embora
compartilhasse com o profeta um discernimento parcial de
coisas maiores do
que podia expressar
em palavras. Certamente que estas
passagens não se
encontravam vazias de
esperança quando primeiramente
foram enunciadas, mas a qualidade dessa "certeza" é que era
variável. Constituía principalmente uma inferência
da experiência pessoal
do autor com Deus e a sua percepção de um propósito divino correndo
através da História. Ele tinha
fé suficiente para
vislumbrar a promessa,
embora esta estivesse muito
longínqua. As suas
palavras podem incluir,
muitas vezes, a esperança
de ser livrado
de uma morte
física imediata, mas
não podemos limitar a isso o seu
significado. O elemento de predição é mesmo mais forte na forma profética, mais
geral, de alguns Salmos.
É verdade que
cada predição tem
de esperar pelo cumprimento antes
de poder ser
completamente compreendida, mas existe, de algum modo, desde a sua
primeira expressão. Por exemplo, o Sl 16.8-11 é interpretado em At 2.25-32 e o
Sl 2 é compreendido em At 4.26; Hb
1.5; 5.5, de
uma forma que
esclarece e preenche
completamente o que, na maior
parte, podia ter sido apenas parcial e esquemático na mente do salmista.
De fato, a
origem da ideia
pode ter para
ele uma relação secundária com a sua interpretação
final. A revelação de Deus em Cristo é o ponto central da história do mundo (Hb
9.26; Rm 8.19-22). Não é, pois, surpreendente que, à medida que os séculos
deslizam para o passado, tal verdade
eterna causasse em
homens piedosos uma
"advertência" crescente de acontecimentos iminentes e
relacionados. O Senhor escolheu Israel para certo propósito. Do ponto de vista
divino esse objetivo já estava cumprido
(1Pe 1.20; Ef
1.10) e a
corrente da experiência
humana, sob Deus, incluía
recursos que tornavam
possível a sua
revelação.
Em conclusão, devemos considerar o Saltério
de um modo muito semelhante à forma como encaramos uma catedral; não meramente
como um agregado de estilos arquitetônicos e sistemas decorativos constituídos
pelo curso da história numa unidade, mas como um lugar cujo propósito é servir
de auxílio no culto a Deus. Contudo, por mais interessantes que sejam os
elementos de arquitetura ou literários, ambos
perderiam a razão
essencial da sua
existência se o seu
significado espiritual e função fossem ignorados ou rebaixados.
Os salmos são respostas dos sacerdotes e do
povo diante dos atos de livramento e de revelação de Deus na história deles.
São revelação e também resposta. Por meio deles aprende-se o que a salvação
divina em sua variada plenitude significa para o povo de Deus, bem como o nível
de adoração e a
amplitude da obediência
a que devem
almejar. Não é de
surpreender que Salmos,
juntamente com Isaías,
tenha sido o
livro mais citado por
Jesus e seus
apóstolos. Os cristãos
primitivos, como seus antepassados judeus, ouviram a palavra
de Deus nesses hinos, queixas e instruções e fizeram deles o fundamento da vida
e do culto.
O Louvor
a Deus
Sl 9.1,2 “Eu te louvarei, SENHOR, de todo o
meu coração; contarei todas as tuas maravilhas. Em ti me alegrarei e saltarei
de prazer; cantarei louvores ao teu nome, ó Altíssimo.”
A.
A
importância do louvor
O Antigo Testamento emprega três palavras
básicas para conclamar os israelitas a louvarem a Deus: a palavra barak (também
traduzida “bendizer”); a palavra balal (da qual deriva a palavra “aleluia”, que
literalmente significa “louvai ao Senhor”); e a palavra yadah (às vezes
traduzida por “dar graças”).
O
primeiro cântico na
Bíblia, entoado depois
de os israelitas
atravessarem o mar Vermelho, foi,
em síntese, um hino de louvor e ação de graças a Deus (Êx 15.2). Moisés
instruiu os israelitas
a louvarem a
Deus pela sua
bondade em conceder-lhes a terra
prometida (Dt 8.10). O cântico de Débora, por sua vez, congregou o povo
expressamente para louvar ao Senhor (Jz 5.9). A disposição de Davi
em louvar a
Deus está gravada,
tanto na história
da sua vida
(2Sm 22.4,47,50; 1Cr 16.4
,9, 25, 35,
36; 29.20), como
nos salmos que
escreveu (9.1,2; 18.3; 22.23;
52.9; 108.1, 3;
145). Os demais
salmistas também convocam o povo
de Deus a, enquanto viver, sempre louvá-lo (33.1,2; 47.6,7; 75.9; 96.1-4; 100;
150). Finalmente, os profetas do Antigo Testamento ordenam que o povo de Deus o
louve (Is 42.10,12; Jr 20.13; Sl 12.1; 25.1; Jr 33.9; Jl 2.26; Hc 3.3).
UNidade 3
Os
escritos de Salomão:
Provérbios,
Eclesiastes e Cantares (Cântico dos Cânticos)
1 - Provérbios
A
palavra traduzida "provérbio" (mashal)
se deriva de
uma raiz que
parece significar "representar" ou "assemelhar-se".
Sua significação básica, portanto, é uma
comparação ou símile.
Seu germe pode ser
uma analogia entre
os mundos natural e
espiritual (cf. 1Rs
4.33 e Pv
10.26). A mesma palavra é
apropriadamente traduzida como
"parábola" em Ez
17.2. Esse termo, entretanto, também denotava afirmações
onde nenhuma analogia é evidente e veio a designar um dito expressivo ou máxima
(cf. 1Sm 10.12).
Porém,
os provérbios deste
livro não são
tanto máximas populares
como a destilação da sabedoria de
mestres que conheciam a lei de Deus e estavam aplicando seus
princípios a todos
os aspectos da
vida.
O livro de
Provérbios é uma
antologia inspirada de
sabedoria hebraica. Esta sabedoria, no entanto, não
é meramente intelectual ou secular.
É principalmente a aplicação dos
princípios da fé
revelada às tarefas
da vida diária. Nos Salmos temos
o hinário dos hebreus; em Provérbios temos o seu manual para a justiça diária.
Neste último encontramos orientações práticas e éticas para a religião pura e
sem mácula.
Dito de outra forma, o livro de Provérbios
representa a sabedoria inspirada dos sábios. A palavra hebraica mashal,
traduzida por “provérbio”, tem os sentidos de “oráculo”, “parábola”, ou “máxima
sábia”. Por isso, há declarações longas no livro de Provérbios (por exemplo,
1.20-33; 2.1-22; 5.1-14), mas há também as concisas, mas ricas de sentido e
sabedoria, para se viver de modo prudente e justo. O conteúdo de Provérbios
representa uma forma de ensino comum no Oriente antigo, mas no caso deste
livro, sua sabedoria é diferente porque veio da parte de Deus, com seus padrões
justos para o povo do seu concerto. O
ensino mediante provérbios era popular naqueles antigos tempos, em virtude da
sua grande clareza e facilidade de memorização e transmissão de geração em
geração.
Assim como Davi é o manancial da tradição
salmódica em Israel, Salomão é o manancial da tradição sapiencial em Israel
(ver Pv 1.1; 10.1; 25.1). Conforme 1Rs 4.32, Salomão produziu 3.000 provérbios
e 1.005 cânticos. Outros autores mencionados por nome em Provérbios são Agur
(Pv 30.1-33) e o rei Lemuel (Pv 31.19), ambos desconhecidos.
Definição
e Forma literária
A
palavra
"provérbio", em nossos
dias significa um
ditado breve e
incisivo, expressando uma observação
verdadeira e conhecida
concernente à experiência humana
- por exemplo: "Deus
ajuda quem cedo
madruga". Há diversas coletâneas
de provérbios modernos
publicadas nas mais
diversas línguas e culturas.
Para o antigo
hebreu, no entanto,
a palavra "provérbio" (mashal) tinha um
significado muito mais amplo. Era usada não somente para expressar uma máxima,
mas para interpretar um ensino ético da fé do povo de Israel. A
palavra vem do
verbo que significa
"ser como" ou
"comparar". Por
isso, no
livro de Provérbios
encontramos uma série
de símiles, contrastes
e paralelismos. O paralelismo de duas linhas é a forma predominante
encontrada em Provérbios. Dentro dos limites desse modo de expressão há uma
variedade extraordinária. Existe o
paralelismo antitético (10.1),
o paralelismo sinônimo (22.1) e
o paralelismo progressivo, ou
sintético (11.22). Encontramos
o paralelismo também em
outras partes das Escrituras do
Antigo Testamento, especialmente
em Salmos.
O livro de Provérbios é escrito e estruturado
em forma poética, sendo que os ditos aparecem geralmente em parelhas de versos
(dísticos). Muitas versões e traduções
modernas seguem o
padrão poético do
original hebraico. Não é
difícil perceber a
estrutura das partes
principais do livro.
No entanto, o conteúdo em cada uma dessas partes muitas vezes
resiste a um arranjo bem organizado. Em muitos casos não há conexão lógica
entre um provérbio e os adjacentes.
Autoria
O título geral é "Provérbios de Salomão,
filho de Davi". Em diversos pontos do livro, entretanto, ocorrem rubricas
que denotam a autoria de diferentes seções. Assim, há seções atribuídas a
Salomão em 10.1 e aos "sábios", em 22.17 e
24.23. Em 25.1
existe uma interessante
rubrica: "provérbios de Salomão,
os quais transcreveram
os homens de
Ezequias, rei de
Judá"; o capítulo 30 é
introduzido como: "palavras de Agur, filho de Jaque"; e o capítulo 31
com os seguintes termos: "palavras do rei Lemuel", ou melhor, de sua
mãe.
Salomão
No
livro de Provérbios,
a sabedoria não
é simplesmente intelectual,
mas envolve o homem inteiro. Salomão amava ao Senhor (1Rs 3.3); ele orou
pedindo um coração entendido pala discernir entre o bem e o mal (1Rs 3.9,12);
sua sabedoria foi-lhe proporcionada
por Deus (1Rs
4.29), e era
acompanhada por profunda humildade (1Rs 3.7); foi testada em
questões práticas, tais como administração justa (1Rs 3.16-28) e diplomacia
(1Rs 5.12). Sua sabedoria tornou-se famosa no oriente (1Rs 4.30 e segs.;
10.1-13); ele compôs provérbios e cânticos (1Rs 4.32) e respondeu
"enigmas" (1Rs 10.1); e muito de sua coletânea de fatos foi tirado da
natureza (1Rs 4.33).
Consideramos que as coleções em Pv. 10-22.13
e 25-29 vieram substancialmente
dele. Existem, naturalmente, outros
elementos salomônicos em outras
porções do livro.
Mas mesmo assim,
essas coleções podem
ser apenas uma seleção inspirada dentre sua sabedoria, pois não existem
cerca de 3.000 provérbios em todo o livro de Provérbios (cf. 1Rs 4.32).
A tradição hebraica atribuiu o livro de
Provérbios a Salomão assim como atribuiu o de Salmos a Davi. Israel considerava
o rei Salomão o seu sábio por excelência. E há justificativas suficientes para
esse reconhecimento. O reinado de quarenta anos de Salomão em Israel foi
realmente brilhante. É evidente que esses anos não deixaram de ter os seus defeitos.
Os muitos casamentos de Salomão não contam pontos a favor dele (1Rs 11.1-9). Na
parte final do seu reinado ele preparou o cenário para a dissolução do seu
grande império (1Rs 12.10). Não obstante, ele realizou um ótimo reinado durante os
anos dourados de
prosperidade e poder
de Israel. A arqueologia é
testemunha das suas
habilidades na arquitetura
e engenharia, da sua
competência na administração
e da sua
capacidade como industrialista. O historiador sacro de 1Reis nos conta
que Salomão amou o Senhor (3.3); ele orou pedindo a Deus um coração
compreensivo (3.3-14); ele mostrou
possuir sabedoria em
questões práticas da administração (3.16-28); a sua sabedoria
foi concedida por Deus (4.29); ele era conhecido por sua sabedoria superior entre
as nações vizinhas (4.29-34); ele escreveu 3.000 provérbios e mais de mil hinos
(4.32); e foi capaz de responder às perguntas mais difíceis da rainha de Sabá.
Existem
pelo menos duas
coleções de "palavras dos
sábios" no livro
de Provérbios; estas se encontram em 22.17-24.22 e em 24.23-34. Talvez
que os capítulos 1-9, que contêm uma exposição do alvo e do conteúdo do
"conselho dos sábios", venham da mesma origem. É virtualmente
impossível datar essas coleções.
Provavelmente representam a
sabedoria destilada de
muitos indivíduos que temiam a Deus e viveram dentro de um considerável
período de tempo. Porém muito desse material é de data antiga. E. J. Young
sugere que pode ser até pré-salomônico.
Data
Quando
foram as coleções de provérbios reunidas,
formando um livro
conforme o conhecemos
agora? Embora grande parte do
livro de Provérbios tenha sua origem na época de Salomão, no décimo século
a.C., a conclusão
da obra não pode ser datada
antes de 700 a.C., aproximadamente duzentos e cinquenta anos após o seu reinado. Uma
seção contém a
coleção de provérbios
que os escribas
de Ezequias copiaram de obras anteriores de Salomão. Alguns estudiosos
datam a edição final
de Provérbios ainda
mais tarde, mas
antes do período
de conclusão do Antigo
Testamento - 400 a.C.
Outros ainda chegam
a datar a edição final no período inter-testamental.
Uma referência ao livro de Provérbios no livro apócrifo de
"Eclesiástico" ("A Sabedoria de Jesus Ben Sirach"), escrito
em torno
de 180 a.C.,
indica que nessa
época Provérbios era
amplamente aceito como parte da tradição religiosa e literária de
Israel.
Mensagem
Relevante
A mensagem do livro de Provérbios é sempre
relevante. Os seus ensinos "cobrem todo o horizonte dos interesses
práticos do cotidiano, tocando em cada faceta da existência humana. O homem é
ensinado a ser honesto, diligente, autoconfiante, bom vizinho, cidadão ideal e
modelo de marido e pai. Acima de tudo, o sábio deve andar de forma reta e justa
diante do Senhor". (PURKISER, 1955, p. 255).
A
sabedoria de Provérbios
coloca Deus no
centro da vida
do homem. A
sabedoria expressa por Salomão
no Antigo Testamento,
teria a sua
revelação mais plena
em Jesus Cristo nos dias da nova aliança. Disse Jesus: "A Rainha do
Sul se levantará no Dia do Juízo com esta geração e a condenará, porque veio
dos confins da terra para ouvir a sabedoria de Salomão. E eis que está aqui
quem é mais do que Salomão" (Mt 12.42; Lc 11.31). Paulo falou de Cristo
como a "sabedoria de Deus" (1Co 1.24; CI 2.3). Kidner diz
que no livro
de Provérbios a
sabedoria "é centrada
em Deus, e
mesmo quando é extremamente real e relacionada ao dia-a-dia consiste da
maneira inteligente e sadia de conduzir a vida no mundo de Deus, em submissão à
sua vontade".
Sabedoria é encontrar
a graça de
Deus e viver
diariamente em harmonia com os
propósitos salvadores que Ele tem para nós.
Dessa forma, Provérbios é o livro
mais prático do
Antigo Testamento, pois
abrange uma ampla área
de princípios básicos
de relacionamentos e
comportamentos corretos na vida cotidiana — princípios estes aplicáveis
a todas as gerações e culturas.
Sua sabedoria prática, seus preceitos santos,
e seus princípios básicos para a vida são expressos em declarações
breves e convincentes, de
fácil memorização e recordação pela juventude como diretrizes para a
vida.
A família ocupa um lugar de vital importância
em Provérbios, assim como ocupava no concerto entre Deus e Israel (confronte Êx
20.12, 14, 17; Dt 6.19). Pecados que violam o propósito de Deus para a família
são expostos abertamente com a devida advertência contra eles.
Ponto
Saliente: O
Coração
Pv 4.23 “Sobre tudo o que se deve guardar,
guarda o teu coração, porque dele procedem as saídas da vida.”
Definição
de coração
O povo da atualidade geralmente considera que
o cérebro é o centro diretor da atividade humana. A Bíblia, no entanto,
refere-se ao coração como esse centro; “dele procedem as saídas da vida” (4.23;
cf. Lc 6.45). Biblicamente, o coração pode ser considerado como
algo que abarca a
totalidade do nosso
intelecto, emoção e vontade (Mc 7.20-23).
O
coração é o
centro do intelecto.
As pessoas sabem
as coisas em
seus corações (Dt 8.5),
oram no coração
(1Sm 1.12,13), meditam
no coração (Sl 19.14), escondem a Palavra de Deus no
coração (Sl 119.11), maquinam males no coração (Sl 140.2),
guardam as palavras
da sabedoria no coração (4.21), pensam
no coração (Mc
2.8), duvidam no
coração (Mc 11.23),
conferem as coisas no coração (Lc
2.19), crêem no coração (Rm 10.9) e cantam no coração (Ef 5.19). Todas essas
ações do coração são primordialmente fatos a envolver a mente.
O coração é o centro das emoções. A Bíblia
fala a respeito do coração alegre (Êx 4.14), do coração amoroso (Dt 6.5), do
coração medroso (Js 5.1), do coração corajoso (Sl 27.14), do coração
arrependido (Sl 51.17), do coração ansioso (12.25), do coração irado (19.3), do
coração avivado (Is 57.15), do coração angustiado (Jr 4.19; Rm 9.2), do coração
gozoso (Jr 15.16), do coração pesaroso (Lm 2.18), do coração humilde (Mt
11.29), do coração ardente pela Palavra do Senhor (Lc 24.32) e do coração
perturbado (Jo 14.1). Todas essas atitudes do coração são, antes de tudo, de
natureza emocional.
Por
fim, o coração
é o centro
da vontade humana.
Lemos nas Escrituras
a respeito do coração endurecido que se recusa a fazer o que Deus ordena
(Êx 4.21), do coração
submisso a Deus
(Js 24.23), do
coração que decide
fazer algo para Deus (2Cr 6.7), do coração que se dedica a buscar o
Senhor (1Cr 22.19), do coração que deseja receber as bênçãos do Senhor (Sl
21.1-3), do coração inclinado aos estatutos de Deus (Sl 119.36) e do coração
que deseja fazer algo pelos outros (Rm 10.1). Todas essas atividades ocorrem na
vontade humana.
A natureza do coração distante de Deus
Quando
Adão e Eva
deram ouvidos à
tentação da serpente
para que comessem da árvore do
conhecimento do bem e do mal, sua decisão afetou horrivelmente o
coração humano, o qual ficou
repleto de maldade.
Desde então, segundo o testemunho
de Jeremias: “Enganoso é o coração, mais
do que todas as
coisas, e perverso;
quem o conhecerá?”
(Jr 17.9). Jesus confirmou a
descrição de Jeremias,
quando disse que
o que contamina
uma pessoa diante de Deus não é o descumprimento de uma lei cerimonial,
mas, sim, a obediência às inclinações malignas alojadas no coração tais como
“os maus pensamentos, os adultérios, as prostituições, os homicídios, os
furtos, a avareza, as maldades,
o engano, a
dissolução, a inveja,
a blasfêmia, a soberba,
a loucura” (Mc
7.21,22). Jesus expôs
a gravidade do
pecado no coração ao declarar que
o pecado da ira é igual ao assassinato (Mt 5.21,22), e que o
pecado da concupiscência é
tão grave como
o próprio adultério
(Mt 5.27,28; Êx 20.14; Mt 5.28).
Um coração entregue à prática da iniquidade
corre o grave risco de tornar-se endurecido.
Quem se recusa
continuamente a ouvir
a palavra de
Deus e a obedecer ao que Deus ordena e, em vez
disso, segue os desejos pecaminosos do seu coração, verá que, depois, Deus
endurecerá seu coração de tal modo que se tornará insensível para com a Palavra
de Deus e os apelos do Espírito Santo (Êx 7.3; Hb 3.8). O principal exemplo
bíblico desse fato é o coração de Faraó,
na ocasião do
êxodo (Êx 7.3,
13, 22-23; 8.15,
32; 9.12; 10.1;
11.10; 14.17).
Paulo viu o mesmo princípio geral em ação na
sociedade ímpia da presente era (Rm 1.24,26,28) e predisse que também ocorreria
o mesmo fato nos dias do anticristo
(2Ts 2.11,12). O
livro aos Hebreus
contém muitas advertências
ao crente, no para que não endureça o seu coração (e.g., Hb 3.8-12).
Todo aquele que persistir na
rejeição da Palavra
de Deus, terá
por fim um
coração endurecido.
O coração regenerado
A solução de Deus para o coração pecaminoso é
a regeneração, que tem lugar em
todo aquele que se arrepende
dos seus pecados,
volta-se para Deus,
e pela fé aceita a Jesus como seu Salvador e Senhor pessoal.
A
regeneração está ligada
ao coração. Aquele
que, de todo o coração,
se arrepende e confessa que Jesus é Senhor (Rm 10.9), nasce de novo e
recebe da parte de Deus um coração novo (Sl 51.10; Ez 11.19).
No
coração daquele que
experimenta o nascimento
espiritual, Deus cria o
desejo de amá-lo e de obedecê-lo. Repetidas vezes, Deus realça diante do seu
povo a necessidade do amor que provém do coração (Dt 4.29; 6.6). Tal amor e
dedicação a Deus
não podem estar
separados da obediência
à sua lei
(Sl 119.34,69,112). Jesus ensinou
que o amor
a Deus, de
todo o coração, juntamente com o amor ao próximo,
resume toda a lei de Deus (Mt 22.37-40).
O amor de todo o coração é o elemento
essencial a uma vida de obediência. Repetidas vezes, o povo de Deus, no passado,
procurou substituir o verdadeiro amor
do coração pela
observação de formalidades
religiosas exteriores (tais como
festas, ofertas e
sacrifícios; Is 1.10-17;
Nm 5.21-26; Dt
10.12). A observância exterior
sem o desejo interior de servir a Deus é hipocrisia, e foi severamente
condenada por nosso Senhor (Mt 23.13-28; Lc 21.1-4).
Muitos outros fatos espirituais têm lugar no
coração da pessoa regenerada. Ela louva a Deus de todo o coração (Sl 9.1),
medita no coração (Sl 19.14), clama a Deus
do coração (Sl
84.2), busca a
Deus de todo
o coração (Sl
119.2, 10), oculta a Palavra de
Deus no seu coração (Sl 119.11; Dt 6.6), confia no Senhor de todo
o coração (3.5),
experimenta o amor
de Deus derramado
em seu coração (Rm 5.5) e canta a
Deus no seu coração (Ef 5.19; Cl 3.16).
2 -
Eclesiastes
Poucos
escritos bíblicos têm
provocado gama tão
grande de opiniões
com respeito ao significado
como Eclesiastes. Tentar
determinar o centro
de sua mensagem revela-se
uma tortura e
uma frustração, mas
não deixa de ser
também importante. O livro nos apresenta uma caixa repleta de enigmas. Cada
vez que
a abrimos temos
de enfrentar de
novo seu estilo,
percorrer seus argumentos, decodificar
suas figuras. E
ao fazer isso
percebemos Deus agindo, vemos
nossos problemas humanos
diminuídos, encontramos alertas contra nossas soluções simplistas.
Aguçamos nossos anseios por aquele cuja cruz
e ressurreição são
janelas para a plenitude
do que Deus deseja
para a vida humana.
O título hebraico “Koheleth” (derivado de
kahal, “reunir-se”) significa "Pregador" ou "alguém
que se dirige
à uma assembléia". O
termo é usado
sete vezes nesse livro,
mas não aparece
em nenhum outro
do Antigo Testamento.
Os tradutores gregos deram-lhe o nome de "Eclesiastes", que
significa "função de pregador". É um título bem apropriado, pois
contém muitas características de sermão, embora não principie por texto
bíblico.
No versículo inicial de Eclesiastes, o autor
se identifica como "pregador" (koheleth). A palavra vem de uma raiz
que significa "reunir", e, assim, provavelmente indica alguém que
reúne uma assembleia para ouvi-Io falar, portanto, um orador ou pregador. A Septuaginta
usou o termo grego Eclesiastes, que as traduções em inglês e português
transpuseram como o nome do livro. O termo designa "um membro da ecclesia,
a assembleia dos cidadãos na Grécia". Já no início da era cristã, ecclesia
era o termo usado para se referir à Igreja.
Autoria
Quem era Koheleth? A linguagem de 1.1 e a
descrição do capítulo 2 parecem indicar
o rei Salomão.
A autoria salomônica
foi aceita tanto
pela tradição judaica como pela
tradição cristã até épocas relativamente recentes. Martinho Lutero parece ter
sido o primeiro a negar isso, e provavelmente a maioria dos estudiosos da
Bíblia concordaria com ele.
No
primeiro versículo, o
livro é atribuído
ao "filho de
Davi, rei em Jerusalém" [...] Entretanto, em 1.12
diz: "Eu, o pregador, fui rei sobre Israel em Jerusalém". Claramente,
nunca houve época
alguma na vida
de Salomão em que ele pudesse se referir ao seu reino no pretérito. Em
2.4-11 também são descritos os feitos do reinado de Salomão como algo que já era
passado no tempo em que foi escrito.
Novamente,
em 1.16 o
autor diz: "e
sobrepujei em sabedoria
a todos os que houve antes de mim, em
Jerusalém". O mesmo pensamento se repete em 2.7. No caso de Salomão,
apenas Davi precedeu Salomão como rei em Jerusalém. Mais uma vez devemos
lembrar que os judeus usavam o termo "filho" para qualquer
descendente; assim, Jesus também é descrito como o "filho de Davi".
Entre os estudiosos mais recentes e
conservadores se lê: "O autor do livro foi alguém que viveu no período
pós-exílico e colocou suas palavras na boca de Salomão, assim empregando um
artifício literário para transmitir sua mensagem". O
argumento aparentemente mais
forte contra a
autoria salomônica é a
presença de palavras aramaicas no texto que não parecem ter sido usadas no
tempo de
Salomão. Archer, entretanto,
argumenta contra a
validade dessa evidência, declarando
que "o livro de Eclesiastes não se encaixa em nenhum período na
história da língua
hebraica [...] não
existe no momento
nenhum fundamento concreto para datar esse livro com base em aspectos
linguísticos (embora não seja
mais estranho ao
hebraico do século
X do que
é para o hebraico do século V ou do século II).
Por um lado, depois de Lutero ter negado a
autoria salomônica, a maioria dos eruditos da Bíblia negaram-na. Eis as
principais razões: (a) As condições históricas não parecem ser da época de
Salomão. (b) O nome de Salomão não aparece no livro, como no Livro de
Provérbios e Cantares.
(c) A linguagem, o uso das palavras e o
estilo são supostamente pós-exílio, contendo muito do aramaico.
(d) A introdução refere-se à Salomão como a
um herói, não como a um autor.
Por
outro lado, muitos
eruditos conservadores sustentam
que Salomão foi o
autor pelas seguintes razões:
(a) As auto-identificações do autor indicam
Salomão (1.1,12; 2.7,9; 12.9). Caso Salomão não fosse seu autor, a falsa
personificação do mais sábio de todos os homens sábios teria sido descoberta há
muito tempo pelos rabinos de Israel, e esses não permitiriam a inclusão do
livro no Cânon.
(b) O autor identifica-se como aquele que
reuniu e organizou muitos provérbios (12.9; comparar com 1Rs 4.32).
(c) A tradição judaica atribuiu o livro à
Salomão. As experiências, argumentos e conclusões apresentados requerem um
autor como Salomão, pessoa de grande sabedoria, riqueza, fama, sucesso nos
negócios e paixão por mulheres. Não houve ninguém tão maravilhosamente
bem-dotado para a tarefa de pesquisar e escrever esse livro como Salomão.
Interpretação
Como
devemos interpretar a
mensagem deste livro?
O leitor logo
fica impressionado por pontos
de vista evidentemente
contraditórios. Uma teoria persistente defende
que o livro é
um diálogo com perspectivas contraditórias apresentadas por
personagens diferentes. Se este ponto de vista for aceito, a expressão frequentemente
repetida "vaidade de vaidades" seria o veredicto do autor num
panorama que se
restringe apenas ao
mundo presente. Outra abordagem favorita
tem sido associar
a perspectiva consistentemente pessimista ao
autor inicial e
explicar pontos de
vista contraditórios como inserções de autores posteriores que
tentaram corrigir afirmações exageradas com o propósito de tornar o livro mais
coerente com os ensinamentos religiosos em vigor na época.
O livro de fato apresenta oscilações entre confiança e pessimismo. Mas elas não
precisam nos instigar a abandonar a convicção na unidade e integridade de
Eclesiastes. Tais oscilações não seriam uma consequência natural da luta entre
a fé, por um lado, e os interesses pelos assuntos mundanos, por outro,
tanto no
coração do próprio
Salomão como na
vida centrada na
terra que o livro
retrata? Barton escreve:
"Quando um homem
contemporâneo percebe quantos
conceitos diferentes e estados de humor ele pode ter, descobre menos autores em
um livro como Koheleth" (1908, p. 162).
Se
este livro representa a luta de
uma alma com dúvidas sombrias,
também revela o comportamento de um homem que notou o lado positivo das
coisas. Apesar de sua atitude pessimista, a vida é tão preciosa quanto um
"copo de ouro" (12.6), e a resposta final ao sentido da vida é:
"Teme a Deus e guarda os seus mandamentos" (12.13).
Organização
Eclesiastes não é um livro racional ou
organizado de maneira lógica. É como um diário no qual um homem registrou suas
impressões de tempos em tempos. Muitas
vezes ele prefere
expressar sentimentos do
momento e reações emocionais a apresentar uma filosofia
equilibrada sobre a vida. Geralmente o estado de espírito é de ceticismo, mas
ainda assim Peterson escreve: "Teria sido uma desgraça e uma grande pena
se um livro que foi escrito para ser a Bíblia de todos os homens não se
referisse ou deixasse de lidar com o espírito de ceticismo que é comum a todos
os homens" (1954, p. 30).
A
estrutura do livro
faz dele um
livro tão difícil
de esboçar que
muitos comentaristas nem tentam
identificar um padrão
lógico. Às vezes
o leitor cuidadoso irá
perceber que um
destaque aponta para
um pensamento significativo
daquela seção mais do que para um resumo de tudo que está ali.
Embora ocasionalmente os parágrafos estejam
relacionados apenas vagamente entre si, todos eles estão relacionados ao tema
do livro talvez isso só seja verdade porque esse tema é tão amplo quanto a
própria vida!
Estilo
Eclesiastes
ou Pregador é,
em muitos aspectos,
um livro enigmático.
De construção um tanto
desconexa, de vocabulário
obscuro, com estilo frequentemente complicado,
desafia o entendimento
do leitor. Contém
certo número de palavras que não se encontram no resto do Antigo
Testamento, e cujo significado é difícil de determinar com precisão. Faz alusão
a incidentes, costumes e dizeres que teriam sido facilmente entendidos por seus
primeiros leitores, mas sobre
os quais não
possuímos indicação alguma.
Contém incoerências
aparentes, o que
torna difícil precisar
qual o ponto
de vista do próprio autor. Esses contrastes têm levado
alguns a supor que o livro original foi
reescrito e "expurgado" por
diversas mãos. O modo pelo
qual o escritor arrumou seu material sugere
que não houve a preocupação de dar
qualquer sequência ligada de
pensamento a correr
livro afora.
A
despeito de todas
essas dificuldades e
obscuridades, entretanto, o
livro exerce um poderoso
fascínio. Torna-se imediatamente
evidente, para o
leitor dotado de discernimento, que
aqui temos uma
penetrante observação e criticismo
sobre a cena
humana.
3 -
Cantares
O título hebraico deste livro pode ser
traduzido literalmente por “O Cântico dos Cânticos”, expressão esta que
significa “O Maior Cântico” (assim como “Rei dos reis” significa “O Maior
Rei”). É, portanto, o maior cântico nupcial já escrito. Salomão foi um escritor
prolífico de 1005 cânticos (1Rs 4.32). Seu nome consta no versículo inicial,
que também fornece o título do livro (Ct 1.1), e em seis outros trechos do
livro (Ct 1.5; 3.7,9,11; 8.11,12). O escritor também identifica- se com o
noivo; é possível que o livro tenha sido originalmente uma série de poemas
trocados entre ele e a noiva. Os oito capítulos do livro fazem referência a
pelo menos quinze espécies diferentes de animais e vinte e uma espécies de
plantas. Esses dois campos foram investigados e mencionados por Salomão em
numerosos outros cânticos (1Rs 4.33). Finalmente, há referências geográficas no
livro de lugares de todas as partes da terra de Israel, o que sugere que o
livro foi composto antes da divisão da nação em Reino do Norte e Reino do Sul.
Salomão deve ter composto este livro no início do seu reinado, muito antes de
sua execrável poligamia. Liturgicamente, Cantares de Salomão veio a ser um dos
cinco rolos da terceira parte da Bíblia hebraica, os Hagiographa (“Escritos
Sagrados”). Cada um desses rolos era lido publicamente numa das festas anuais
dos judeus.
Propósito
Este
livro foi inspirado
pelo Espírito Santo
e inserido nas
Escrituras para ressaltar a
origem divina da
alegria e dignidade
do amor humano
no casamento. O livro de Gênesis revela que a sexualidade humana e
casamento existiam antes da
queda de Adão
e Eva no
pecado (Gn 2.18-25).
Embora o pecado tenha
maculado essa área
importante da experiência
humana, Deus quer que
saibamos que a
dita área da
vida pode ser
pura, sadia e
nobre. Cantares de Salomão,
portanto, oferece um
modelo correto entre
dois extremos através da história: (a) o abandono do amor conjugal para
a adoção da perversão sexual (isto é conjunção carnal de homossexuais ou de
lésbicas) e prática heterossexual
fora do casamento
e uma abstinência
sexual, tida (erroneamente) como
o conceito cristão do sexo, que nega o valor positivo do amor físico e normal
conjugal.
Tanto Cantares de Salomão como o título
alternativo, O Cântico dos Cânticos, vêm do primeiro versículo do livro. O
cabeçalho Cântico dos Cânticos é uma tradução literal do hebraico shir hashirim. Essa linguagem coloca a
ênfase na qualidade superlativa portanto o cântico é descrito como o melhor ou
o mais excelente cântico (Gn 9.25; Êx 26.33; Ec 1.2). Na Vulgata (Bíblia
latina) o livro é chamado de Cânticos.
Nas escrituras hebraicas,
Cantares é o
primeiro de cinco
livros curtos chamados "Rolos" (Megilloth).
Os outros quatro
são Rute, Lamentações, Eclesiastes e
Ester. Cada um
desses livros era
lido em um
dos grandes festivais anuais
judeus, sendo que
Cantares era usado
na época da
Páscoa dos judeus.
Tema
Para evitar a subjetividade e honrar o
sentido literal do poema, destaca-se os principais temas do amor e da devoção,
em vez dos detalhes da história. No calor e na força da afeição mútua dos dois
apaixonados, os intérpretes
tipológicos veem insinuações
do relacionamento entre Cristo e
sua Igreja. A justificativa para essa ideia baseia-se em paralelos com poemas
de amor árabes,
que podem ter
significados esotéricos ou místicos;
com o uso
que Cristo fez
da história de
Jonas (Mt 12.40)
ou da serpente no deserto (Jo
3.14); e com as bem conhecidas analogias bíblicas do casamento espiritual
(e.g., Jr 2.2;
3.1ss.; Ez 16.6ss.;
Os 1-3; Ef
5.22-33; Ap 19.9).
São
inegáveis os benefícios
devocionais das interpretações alegóricas
ou tipológicas de Cântico
dos Cânticos. Questiona-se,
porém, a intenção
do autor. Qualquer leitura
alegórica é perigosa porque as possibilidades de interpretação são ilimitadas.
Estamos mais propensos a descobrir nossas ideias do que a discernir o
propósito do autor.
Além disso, o
texto não fornece
indícios de que
Cântico dos Cânticos deva ser
lido em outro sentido, que não o natural.
Forma
Literária
Cantares é um exemplo da poesia hebraica
lírica; é por isso que as traduções para as línguas modernas são dispostas de
forma poética Este antigo poema hebraico
não tinha rima ou métrica como em nossa forma ocidental. Existe muito mais um
equilíbrio e um ritmo de pensamentos do que
de sílabas ou
sons. As linhas
são distribuídas de
tal forma que o
pensamento é apresentado de maneiras diferentes, pela repetição, ampliação,
contraste ou resposta, como em 8.6: “Porque o amor é forte como a morte, e duro
como a sepultura o ciúme; as suas brasas são brasas de fogo, labaredas do
SENHOR”.
Data do
livro
Datar
o livro depende
do ponto de
vista que temos
acerca do seu
autor. Se Salomão escreveu o
Cantares, precisa ser datado no século X a.C. Os eruditos que procuram datá-lo
de acordo com a ocorrência de palavras estrangeiras no texto situam o livro
entre 700 a.C. e 300 a.C.
Características
Especiais
É
o único livro
na Bíblia que
trata exclusivamente do
amor especificamente conjugal; é
uma obra-prima incomparável
da literatura, repleta
de linguagem imaginativa; discreta,
mas realista; tomada
principalmente do mundo
da natureza. As várias
metáforas e a
linguagem descritiva retratam
a emoção, poder e beleza do amor
romântico e conjugal, que era puro e casto entre os judeus, o povo de Deus dos
tempos bíblicos; é um dos poucos livros do Antigo Testamento de que não
se faz referência
no Novo Testamento;
neste livro, consta apenas uma
vez o nome de Deus, em Ct 8.6, mas a inspiração divina permeia o livro,
principalmente nos seus símbolos e figuras.
Conclusão da Unidade 3:
Segundo
a tradição judaica,
Salomão escreveu Cantares
quando jovem; Provérbios, quando
estava na meia-idade,
e Eclesiastes, no
final da vida.
O efeito conjunto do declínio espiritual de Salomão, da sua idolatria e
da sua vida extravagante, deixou-o por fim desiludido, com os prazeres desta
vida e o materialismo, como caminho da felicidade.
Eclesiastes
registra suas reflexões
negativistas a respeito
da futilidade de buscar
felicidade nesta vida,
à parte de
Deus e da
sua Palavra. Ele
teve riquezas, poder, honrarias, fama e prazeres sensuais, em grande
abundância, mas no fim, o resultado de tudo foi o vazio e a desilusão: “vaidade
de vaidades! É tudo vaidade” (1.2). Seu propósito principal ao escrever
Eclesiastes pode ter sido
compartilhar com o
próximo, especialmente os
jovens, antes de
morrer, seus pensamentos e seu testemunho, a fim de que outros não
cometessem os mesmos erros que
ele cometera. Revela
de uma vez
por todas, a
total futilidade do ser
humano considerar bens
materiais e conquistas
pessoais como os reais
valores da vida.
Embora os jovens
devam desfrutar da sua
juventude (11.9,10), o
mais importante é
que se dediquem
ao seu Criador (12.1) e
que decidam temer
a Deus e
guardar os seus
mandamentos (12.13,14). Esse é o único caminho que dá sentido à vida.
BIBLIOGRAFIA
ARCHER,
Gleason L. Jr. Merece Confiança o Antigo
Testamento. São Paulo: Ed. Vida Nova, 2000.
GAGLIARDI,
Ângelo Jr. Panorama do Antigo Testamento.
RJ: vinde, 1995.
NUNES,
Flávio. Livros Poéticos. Instituto
Teológico Gamaliel. S/d.
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